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18 de Abril de 2024

Dizer o Direito: É crime prestar serviço de provedor de acesso à internet sem autorização da ANATEL via rádio?

há 9 anos

Imagine a seguinte situação hipotética:

João mora em um edifício e determinado dia teve uma ideia que ele pensou ser genial.

Decidiu contratar um serviço de internet de alta velocidade para seu apartamento e revender o acesso ao serviço para outras unidades do mesmo prédio.

Assim, a internet chegava em sua casa e de lá, João gerava, por meio de radiofrequência, o serviço para outros moradores que podiam acessar a internet, pagando uma mensalidade a ele.

Ocorre que, alguns meses depois, por iniciativa de uma denúncia anônima, houve fiscalização da ANATEL em sua residência e João foi autuado por estar comercializando internet sem autorização da agência.

Além da infração administrativa, João cometeu algum delito? É crime prestar serviço de provedor de acesso à internet sem autorização da ANATEL via rádio?

SIM. A conduta de prestar, sem autorização da ANATEL, serviço de provedor de acesso à internet a terceiros por meio de instalação e funcionamento de equipamentos de radiofrequência configura o crime previsto no art. 183 da Lei n.º 9.472/97:

Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação:

Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, direta ou indiretamente, concorrer para o crime.

Mas o art. 183 fala em desenvolver “atividades de telecomunicação”. O serviço de internet via radiofrequência pode ser considerada atividade de telecomunicação?

SIM. Segundo entende a ANATEL (opinião seguida pelo STJ), o provimento de acesso à Internet via radiofrequência, na verdade compreende dois serviços: um serviço de telecomunicações (Serviço de Comunicação Multimídia) e um Serviço de Valor Adicionado (Serviço de Conexão à Internet). Portanto, a atividade popularmente conhecida como "Internet via rádio" compreende também um serviço de telecomunicações (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1349103/PB, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 06/08/2013).

O fato de o art. 61, § 1º, da Lei n.º 9.472/97 disciplinar que serviço de valor adicionado “não constitui serviço de telecomunicações” não implica o reconhecimento, por si só, da atipicidade da conduta em análise. Isso porque, segundo a ANATEL, o provimento de acesso à Internet via radiofrequência engloba tanto um serviço de telecomunicações (Serviço de Comunicação Multimídia) quanto um serviço de valor adicionado (Serviço de Conexão à Internet).

Segundo a jurisprudência do STJ, João teria sucesso se invocasse o princípio da insignificância?

NÃO. Segundo a jurisprudência do STJ, é inaplicável o princípio da insignificância ao delito previsto no art. 183 da Lei n.º 9.472⁄97, pois o desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicação é crime formal, de perigo abstrato, que tem como bem jurídico tutelado a segurança dos meios de comunicação (STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 383.884/PB, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 07/10/2014).

Assim, prevalece no STJ o entendimento no sentido de não ser possível a incidência do principio da insignificância nos casos de prática do delito descrito no art. 183 da Lei nº 9.472/97. Isso porque se considera que a instalação de estação clandestina de radiofrequência sem autorização dos órgãos e entes com atribuições para tanto - Ministério da Comunicações e ANATEL - já é, por si, suficiente para comprometer a segurança, a regularidade e a operabilidade do sistema de telecomunicações do país, não podendo, portanto, ser vista como uma lesão inexpressiva (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1323865/MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 17/10/2013).

Obs: o STF, em regra, também nega a aplicação do princípio da insignificância ao crime do art. 183 da Lei n.º 9.472/97. No entanto, possui alguns precedentes admitindo, em casos excepcionais, o reconhecimento do postulado em caso de rádios clandestinas que operem em baixa frequência e em localidades afastadas dos grandes centros. Nesse sentido: HC 104530 e RHC 118014.

De quem é a competência para julgar o delito do art. 183?

Justiça Federal (art. 109, IV, da CF/88) porque afeta diretamente serviço regulado pela União.

Resumindo:

A conduta de prestar, sem autorização da ANATEL, serviço de provedor de acesso à internet a terceiros por meio de instalação e funcionamento de equipamentos de radiofrequência configura o crime previsto no art. 183 da Lei 9.472/97.

Vale ressaltar que, segundo a jurisprudência do STJ, é inaplicável o princípio da insignificância ao delito previsto no art. 183 da Lei 9.472⁄97, pois o desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicação é crime formal, de perigo abstrato, que tem como bem jurídico tutelado a segurança dos meios de comunicação. A exploração clandestina de sinal de internet, sem autorização do órgão regulador (ANATEL), já é suficiente a comprometer a regularidade do sistema de telecomunicações, razão pela qual o princípio da insignificância deve ser afastado. Sendo assim, ainda que constatada a baixa potência do equipamento operacionalizado, tal conduta não pode ser considerada de per si, um irrelevante penal.

STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.304.262-PB, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 16/4/2015 (Info 560).

STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 599.005-PR, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 14/4/2015 (Info 560).


Publicado Por Dizer o Direito

Disponível em: http://www.dizerodireito.com.br/2015/06/e-crime-prestar-servico-de-provedor-de.html

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11 Comentários

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Isso quer dizer que a justiça pune quem por iniciativa própria colocar em risco o cartel das empresas de "telecomunicações" ou seja você tem de continuar pagando caro por um serviço ruim, e qualquer tentativa de sair deste esquema será rigorosamente punida pelos protetores do cartel afinal de contas comunicação e uma área estratégica, para manipulação das massas. continuar lendo

Desde a era das cavernas as leis e/ou costumes são para proteger as classes dominantes. Se algum individuo das castas inferiores for beneficiado por essas leis sem que haja prejuízo da elite sera mero acaso.
Se pudesse ditar leis, usos e costumes de uma população faria contrario aos seus interesses ??? Se sim, seria crucificado e exaltado, no minimo, por dois milênios. continuar lendo

Esta lei e este posicionamento só estimulam o mercantilismo de 4 ou 5 grandes empresas de telecom, que controlam o mercado a seu próprio interesse. Não me conformo em pensar que o estado em vez de facilitar a livre concorrência, criminaliza a livre iniciativa e dificulta o comêrcio de tão importante produto, que é o serviço de telecomunicações. Para se ter uma noção, uma licença de Serviço de Comunicação Multimídia temora no mínimo 6 meses para ser liberada, e é apenas um dos entraves para se regularizar a atividade. Não é uma questão de segurança é uma questão de BURROCRATIZAÇÃO. Ultimamente só as igrejas não são exploradas pelo estado, por isso temos tantas e tão prosperas. continuar lendo

Observando o trecho abaixo:

"o desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicação é crime formal, de perigo abstrato, que tem como bem jurídico tutelado a segurança dos meios de comunicação"

Fico na dúvida, se eu instalar um roteador em casa para uso próprio com meus dispositivos como celular, televisão, computador... Estaria eu desenvolvendo esse perigo abstrato?

Pergunto isso pois o mesmo roteador que uso para uso próprio pode ser usado para "revender" meu acesso. Apenas receber dinheiro por isso, viro perigoso? continuar lendo